Desta vez, gostaria de fazer uma retrospectiva de alguns dos mais importantes e centrais desenvolvimentos e decisões políticas no Brasil sobre proteção ambiental e climática. Perguntei-me, em particular, como se desenvolveu a política brasileira de proteção do ambiente e do clima nos últimos 50 anos. Que medidas concretas foram tomadas pelos diferentes governos? Qual foi o papel do Brasil nas negociações internacionais? Em que direção o Brasil está caminhando atualmente para alcançar as metas climáticas de Paris?
1964-1989: Ditadura militar e transição para a democracia
1990-1992: Governo de Fernando Collor de Mello
1992-2002: Governos de Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso
2003-2010: Governo de Luís Inácio Lula da Silva
2011-2016: Governo de Dilma Rousseff
2016-2018: Governo de Michel Temer
2019 até hoje: Governo de Jair M. Bolsonaro
1964 -1989: Ditadura militar e transição para a democracia
A mudança climática chegou ao público brasileiro pela primeira vez em resposta à pressão política internacional por criticar o desmatamento em grande escala do “pulmão verde” da Terra, a Floresta Amazônica, na década de 1980. Na época, a imprensa internacional estigmatizava o Brasil como o “inimigo mundial do meio ambiente”, como nas manchetes do New York Times de 12 de agosto de 1988 sob o título “Grandes incêndios na Amazônia, causados pelo homem, relacionados ao aquecimento global” e no editorial da mesma publicação intitulada “Quem está queimando a Amazônia? O assassinato de Chico Mendes (líder do sindicato dos seringueiros), em 22 de dezembro de 1988, causou horror mundial porque ele se tornou conhecido mundialmente por ganhar o prestigioso prêmio ambiental “Global 500”. Seu assassinato trouxe o Brasil ainda mais para a ribalta como “inimigo do meio ambiente” de forma negativa. (9). Na década de 1980 também houve resistência inicial no Brasil a essa “interferência de fora”, especialmente dentro da ditadura militar, que temia uma “internacionalização” da parte brasileira da floresta amazônica através de uma política climática global que, a seu ver, teria comprometido a soberania do Brasil.
Naquela época, o Brasil começou a expandir a energia hidrelétrica e a substituir a gasolina e o diesel por bioetanol e biodiesel (já na década de 1920, o Brasil experimentava com óleos vegetais como combustível), que haviam sido decretados pelo Estado em 1975, a fim de reduzir ainda mais sua dependência nacional do petróleo. No entanto, esta baseou-se fundamentalmente em considerações econômicas e não na proteção do clima, pelo que o governo militar não estabeleceu qualquer ligação direta com a proteção do ambiente e do clima.
Com o fim da ditadura militar e a transição democrática entre 1985 e 1989, a questão da mudança climática, que até então era um fenômeno predominantemente científico na forma de levantamentos periódicos das taxas de desmatamento no Brasil, tornou-se finalmente uma questão política. Desde o fim da ditadura militar, o Brasil tem assumido um papel mais proeminente na luta contra o aquecimento global.
Primeiro, os incentivos fiscais que tornaram o desmatamento da floresta amazônica atraente para a expansão da pecuária foram removidos, e as taxas de desmatamento começaram a cair pela primeira vez em muitos anos. O novo governo também introduziu o programa PROCEL (Programa de Conservação de Energia Elétrica) em dezembro de 1985 para reduzir o desperdício de energia elétrica tanto do lado da oferta quanto do lado do consumidor (5). Além disso, notou-se no Brasil que, ao articular problemas ambientais e climáticos, é possível obter maior apoio financeiro e tecnológico internacional para melhor atingir suas próprias estratégias de desenvolvimento ambiental e de sustentabilidade.
Portanto, em 1989, o governo brasileiro chegou a discutir pela primeira vez a ideia de um reflorestamento de 20 milhões de hectares (2,3% da área de terra do Brasil) sem monoculturas em larga escala durante 20-30 anos com financiamento internacional. O chamado projeto “Floram” teve como objetivo não apenas preservar a biodiversidade e fornecer matérias-primas para a indústria, mas, sobretudo, ligar até 115 milhões de toneladas métricas de gases de efeito estufa da atmosfera. No entanto, o projeto “Floram” nunca encontrou o apoio internacional (financeiro) e nacional (político) necessário para se tornar realidade. Enquanto o projeto “Floram” falhou, o monitoramento por satélite para o monitoramento do desmatamento pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) foi grandemente expandido, de modo que, desde 1990, dados muito mais precisos sobre o desmatamento puderam ser coletados.
1990-1992: Governo de Fernando Collor de Mello
Mais pressão política internacional sobre o Brasil resultou da decisão do governo Collor de sediar a “Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD 92, ou simplesmente Eco – 92)” das Nações Unidas em junho de 1992. A conferência do Rio de Janeiro em 1992 foi um grande evento que reuniu no centro Rio as “delegações” de estados e no Aterro do Flamengo o “Fórum Global de Organizações Não Governamentais (ONGs) e Movimentos Sociais” de todo o mundo (9). O resultado da conferência foi a negociação e adopção da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas (CQNUAC). Pouco depois da reunião de cúpula no Rio de Janeiro, o presidente Collor foi destituído do cargo por um voto de desconfiança devido a alegações de corrupção. Como resultado, o interesse pelas alterações climáticas ao mais alto nível político diminuiu acentuadamente durante algum tempo.
1992-2003: Governos de Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso
Internamente, em 1994, o presidente interino seguinte, Itamar Franco, criou uma Comissão Interministerial para o Desenvolvimento Sustentável (CIDES) com o auxílio de um decreto presidencial, que seria responsável pela implementação da Agenda 21 e da Declaração do Rio, bem como de convenções e acordos internacionais sobre proteção ambiental e climática. No entanto, a comissão acabou por ser um fracasso grandioso. Por conseguinte, a CIDES foi substituída em 1997 pela Comissão de Política de Desenvolvimento Sustentável e Agenda 21 Brasileira (CPDS). Após longos debates envolvendo especialistas e partes da sociedade civil, esta última comissão apresentou as intenções de implementação do desenvolvimento sustentável em um documento intitulado Agenda 21 Brasileira: Bases de Discussão, com a perspectiva de apresentar propostas apropriadas para o documento assinado na Rio-92 dentro do marco nacional (9), em meados de 2000 – ou seja, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso.
Na sequência da Conferência do Rio, o Brasil introduziu um Sistema de Gestão Ambiental (SGA) baseado na série de normas ISO 14000. O objetivo desta série de normas é conciliar a proteção do ambiente e a poluição com as necessidades sociais e econômicas.
A Europa foi pioneira na utilização de certificados ambientais de produtos (normas de gestão ambiental). O primeiro selo verde foi o “Anjo Azul”, que foi introduzido na Alemanha em 1978 para identificar produtos que não agridem o meio ambiente. O primeiro certificado brasileiro foi emitido em 1996. Em 1999, 88 empresas brasileiras haviam recebido este certificado ISO 14000, enquanto que já existiam 3000 empresas na Europa (10).
Em geral, entre 1992 e 2002, houve “uma estratégia governamental baseada na integração do Brasil à economia mundial, um processo acelerado de globalização”, que significou “o desmantelamento de barreiras comerciais e a circulação de capitais, privatizações e a abertura da economia ao capital estrangeiro” (9). Internacionalmente, os governos que seguiram Collor perseguiram o objetivo na política ambiental e climática de que o Brasil não assumisse compromissos para reduzir as emissões de gases de efeito estufa na Cúpula COP-1 ou em outras cúpulas.
Ao mesmo tempo, porém, o governo brasileiro também começou a usar as mudanças climáticas como argumento para expandir o programa de bioetanol. Como resultado, as taxas de desmatamento subiram novamente, em parte porque o governo promoveu ativamente a expansão do programa de bioetanol por meio de subsídios estatais. Após a Conferência do Rio, houve um aumento médio anual do desmatamento de cerca de 57%, o que significa que as florestas do tamanho do Acre foram desmatadas entre 1992 e 2000. Da mesma forma, grandes áreas no Cerrado foram cultivadas para exportação através da expansão do cultivo de cereais (especialmente plantações de soja) e o desmatamento da Mata Atlântica não parou (9). Na cúpula da COP-1 em Berlim, em 1996, o governo brasileiro conseguiu assegurar que o Brasil não tivesse que assumir compromissos de redução de emissões nos próximos anos.
Em 2002, o Brasil propôs a Iniciativa Brasileira de Energia, que estabeleceu metas para aumentar o uso de energia renovável em toda a América Latina. A meta era atender 10% das necessidades energéticas da América Latina a partir de fontes renováveis até 2010. A iniciativa foi fortemente apoiada numa reunião dos Ministros do Meio Ambiente dos países da América Latina e do Caribe em Maio de 2002 e influenciou as negociações sobre energias renováveis durante o Congresso Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável. Nos documentos finais da Cúpula, os países são instados a “trabalhar urgentemente para aumentar significativamente a participação global das energias renováveis”.
Em abril de 2002, o Congresso brasileiro aprovou uma lei que visava criar um mercado vinculante para as energias renováveis. A lei previa também o apoio jurídico necessário para a criação de um sistema de suporte da rede nacional com eletricidade proveniente de fontes renováveis. O programa, intitulado Programa de Incentivos às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (PROINFA), ajuda os produtores independentes de eletricidade que utilizam fontes de energia renováveis (principalmente biomassa, pequenas centrais hidroeléctricas e eólicas) a alimentar a rede nacional com uma maior proporção da sua eletricidade.
2003-2010: Governo de Luís Inácio Lula da Silva
Quando o presidente Lula tomou posse em 2003, ele estava determinado a fazer avançar o Brasil com uma mistura de políticas econômicas e sociais, incluindo uma iniciativa liderada pelo governo para promover a produção de biocombustíveis e garantir a segurança do abastecimento de combustível em meio ao aumento dos preços da energia (6).
Lula já havia declarado como candidato em seu programa que queria promover a criação das bases para um Brasil mais sustentável, equitativo e ambientalmente equilibrado. Lula da Silva, portanto, também assinou um decreto presidencial estabelecendo a Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável (CPDS), que, juntamente com a Agenda 21 Brasileira, deveria acompanhar a implementação do desenvolvimento sustentável em nível nacional (9).
O Programa Brasileiro de Produção e Uso de Biodiesel (PNPB) é um exemplo quase perfeito do compromisso do governo com a segurança energética e o crescimento econômico. O programa foi uma iniciativa do governo do presidente Lula da Silva para combinar uma iniciativa de segurança energética na geração de energia e combustíveis de transporte com o desenvolvimento rural sustentável. Abrange tanto as grandes explorações agrícolas como as explorações familiares em todo o território deste país continental. Em muitos aspectos, o PNPB representava a conciliação, se não a harmonização, de interesses econômicos e ambientais divergentes, tanto privados quanto públicos, com uma política pública nacional abrangente que já pagou dividendos mensuráveis a todos os brasileiros. O PNPB promoveu a expansão de seu cultivo para melhorar a viabilidade a longo prazo do biodiesel brasileiro, envolvendo agricultores familiares, cooperativas e pequenos produtores na cadeia produtiva em todo o Norte e Nordeste (6).
Um dos objetivos do PNPB era a integração social. Esse resultado deveria ser alcançado forçando os produtores de biodiesel a comprar óleos vegetais de agricultores familiares e pequenos produtores. O PNPB também prometeu mais segurança energética para o país e para a população amazônica para melhorar a balança comercial do país (com menos importações de petróleo no longo prazo). A Petrobras, empresa estatal brasileira de energia, informou que as importações de diesel, por exemplo, caíram 43% entre 2008 e 2009, pois a produção nacional de diesel, incluindo o biodiesel, aumentou significativamente (6). Como resultado, o presidente Lula anunciou na conferência COP15 em dezembro de 2009 que o PNPB também seria uma parte importante dos compromissos voluntários do Brasil para reduzir as emissões de carbono.
O governo de Lula da Silva também alterou a regulamentação do setor energético para aumentar ainda mais a atratividade e as oportunidades de investimento privado em energia hidrelétrica. De acordo com as novas regras, as centrais hidroeléctricas não podem ser objeto de concurso público enquanto não tiver sido concedida uma licença ambiental pela autoridade pública de planeamento energético. O objetivo era reduzir os riscos ambientais para os investidores e promover os investimentos em energia hidroelétrica.
Em 2006, durante o governo Lula da Silva, enormes depósitos de petróleo foram descobertos a cerca de 250 km da costa do Brasil. O “pré-sal” é uma reserva offshore rica em petróleo presa sob uma camada de sal de 2.000 m de espessura, que por sua vez está abaixo de 2.000 m de espessura em depósitos pós-sal. A dificuldade do Brasil é, portanto, o acesso às suas reservas: está localizado a 7 km sob a superfície do mar (2 km de profundidade da água, seguidos de 5 km de rocha, areia e sal sob o leito do mar). Os chamados “campos do pré-sal” Lula e Libra foram descobertos em 2007 na Bacia de Santos, na costa sudeste do Brasil. O petróleo é produzido no litoral dos estados do Rio de Janeiro e São Paulo desde 2008.
Apesar dessas enormes reservas de petróleo e do aumento da demanda interna, espera-se que o Brasil continue sendo um dos principais usuários de energia renovável, com a energia renovável representando 43% da matriz energética doméstica em 2035. A AIE observa que o etanol produzido internamente a partir da cana-de-açúcar forneceu cerca de 15% do combustível para o transporte rodoviário. No entanto, a procura de combustíveis fósseis continua a crescer rapidamente (7).
Em 2007, o Brasil apresentou o Fundo Amazônia na Conferência das Partes (COP 13) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC), e em 2008 o BNDES aprovou sua criação pelo Decreto nº 1. 6.527 da Presidência da República Federativa do Brasil. O Fundo Amazônia apoia projetos para prevenir, monitorar e combater o desmatamento e promover a conservação e o uso sustentável da Amazônia brasileira. O Relatório Anual 2018 do 10º Aniversário do Fundo Amazônia conclui que a comparação da taxa média de desmatamento dos últimos dez anos (2008-2018) com a média dos últimos dez anos (1998-2008) mostra uma redução de 65% no desmatamento.
2011-2016: Governo de Dilma Rousseff
Em 2012, por ocasião do 20º aniversário da Cúpula da Terra do Rio em 1992, a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável Rio+20 realizou-se novamente no Rio de Janeiro. Os Estados-Membros decidiram elaborar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) para o período 2015-2030. Os objetivos consistiam em desenvolver os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio e determinar a nova agenda de desenvolvimento.
Em 2015, a ex-presidenta Dilma Rousseff, em uma viagem aos EUA, finalmente falou pela primeira vez da intenção concreta do Brasil de acabar com o desmatamento ilegal até 2030 e reflorestar 12 milhões de hectares de floresta. De fato, o desmatamento ilegal já foi reduzido em 80% entre 2005 e 2012 (graças em parte ao trabalho do Fundo Amazônia). Os diplomatas do Brasil também foram importantes mediadores nas negociações do acordo de Paris sobre o clima para superar as diferenças entre países industrializados e emergentes. Com a adoção do Acordo Climático de Paris por 195 Estados em dezembro de 2015 e sua ratificação pelo governo Temer em 2016, o Brasil finalmente assumiu um compromisso vinculativo de alcançar as metas estabelecidas pela ex-presidenta Dilma Rousseff.
2016-2018: Governo de Michel Temer
De fato, até a ratificação do acordo climático de Paris pelo governo do presidente Temer em setembro de 2016, o Brasil ainda não havia assumido um compromisso internacional para reduzir as emissões de gases de efeito estufa.
A ratificação do Acordo de Paris sobre o Clima foi seguida da elaboração do chamado plano “Contribuições Nacionalmente Determinadas” para o Brasil, que estabelece em detalhes como o Brasil pretende alcançar os compromissos assumidos com a ratificação do Acordo de Paris sobre o Clima sob a Lei Internacional. O documento serve como uma referência internacional com base na qual o progresso do Brasil pode ser medido.
Dentro da estrutura do acordo, cada país definiu sua própria contribuição determinada nacionalmente; a CND prometida pelo Brasil é considerada uma das mais ambiciosas com os seguintes cinco objetivos centrais: 1) Aumentar a participação das energias renováveis (eólica e solar) na matriz energética do país para 45%; 2) Aumentar a eficiência energética no setor elétrico em 10% e promover tecnologias limpas e eficiência energética na indústria e nos transportes; 3) Não atingir o desmatamento ilegal na Amazônia brasileira até 2030 e compensar as emissões de gases de efeito estufa da supressão legal da vegetação até 2030; 4) Restaurar e reflorestar 12 milhões de hectares de florestas; 5) Restaurar mais 15 milhões de hectares de pastagens degradadas até 2030 e desenvolver 5 milhões de hectares de sistemas integrados de utilização dos solos e de pecuária (ICLFS) até 2030 (8). No entanto, estimativas nacionais mostram que o desmatamento total atingiu 7900 km2 em 2018, um aumento de 13,7% a partir de 2017 e 72% do mínimo histórico de 2012 (PRODES, 2019). Também nos primeiros meses de 2019, o INPE voltou a reportar um aumento do desmatamento na região amazônica.
O governo Temer também mostrou que os biocombustíveis são um dos poucos pontos de encontro de interesses agrícolas e ecológicos no Brasil. O programa RenovaBio, lançado pelo governo em 2017, visa reduzir a intensidade de carbono da gasolina em 10% até 2028. O programa fará isso introduzindo créditos de economia de CO2 que incentivam os varejistas a misturar seus produtos com mais biocombustíveis. A meta é aumentar gradualmente a participação dos biocombustíveis na oferta total de combustíveis do Brasil de 20% para quase 30%.
Em novembro de 2018, o governo Temer retirou surpreendentemente a sua oferta para sediar a conferência sobre o clima e referiu-se ao processo de transição do governo a 1 de janeiro e aos estrangulamentos orçamentais.
2019 até hoje: Governo de Jair M. Bolsonaro
No início de 2019, o governo de Bolsonaro também cancelou uma reunião das Nações Unidas sobre mudança climática, que deveria acontecer na cidade de Salvador em agosto.
O novo presidente, Jair Bolsonaro, anunciou que aumentará a exploração econômica dos recursos brasileiros e aumentará a mineração comercial e a agricultura nas reservas indígenas. Bolsonaro também acredita que as reservas são muito grandes (cerca de 12% do território brasileiro) e que as tribos devem viver na pobreza e não ser mantidas em reservas “como animais em um zoológico”, mas devem se envolver em atividades comerciais e cobrar royalties das empresas de mineração (12).
Bolsonaro, portanto, tentou transferir a responsabilidade pela demarcação das áreas indígenas do Ministério da Justiça para o Ministério da Agricultura, imediatamente após tomar posse. Pelo mesmo decreto (MP 870), ele também tentou transferir a Agência para Assuntos Indígenas (FUNAI) do Ministério da Justiça para um recém-criado Ministério da Família, da Mulher e dos Direitos Humanos, chefiado por uma pastora protestante ultra conservadora que quer cristianizar os povos indígenas. A FUNAI é responsável pelo monitoramento da atenção à saúde, abrigo e proteção linguística dos grupos indígenas (3).
Em maio de 2019, no entanto, o Congresso e o Senado bloquearam juntos o decreto (12). Um segundo decreto (MP 886), posteriormente assinado pelo presidente Bolsonaro, foi suspenso por unanimidade pelo Supremo Tribunal em junho porque o presidente não foi autorizado a reintroduzir uma emenda legislativa que já havia sido rejeitada pelos parlamentares durante a mesma legislatura. O pedido de suspensão veio das partes Rede Sustentabilidade, PDT e PT (15).
Oito ex-ministros brasileiros do Meio Ambiente criticaram o governo de Bolsonaro em uma carta em maio, dizendo que estavam reduzindo a proteção ambiental do país. Os ex-funcionários criticaram a decisão do governo de retirar a autoridade do Ministério do Meio Ambiente sobre os serviços florestais e a autoridade hídrica, afirmando, ao mesmo tempo, que a falta de diretrizes claras para combater a mudança climática ameaça a capacidade do Brasil de cumprir seus compromissos de reduzir as emissões de gases de efeito estufa.
As alterações incluem a supressão de 95% do orçamento do Ministério do Ambiente para atividades relacionadas com as alterações climáticas, a flexibilização das regras de conversão das sanções ambientais em pagamentos compensatórios alternativos, alterações ao Código Florestal para alargar os prazos das ações de execução e a abolição da maioria dos comitês e comissões de participação cívica e controle social no governo federal. Embora seja difícil prever o impacto que estas alterações regulamentares terão nas emissões, a maioria delas tem potencial para impedir a desflorestação ilegal e outros crimes ambientais (4).
Em julho, cerca de 20 mil garimpeiros entraram ilegalmente no Parque Yanomami, uma das maiores reservas indígenas do Brasil, nos estados de Roraima e Amazonas, perto da fronteira com a Venezuela, segundo o site de notícias ambientais da Mongabay. Ainda há poucos meses, o exército, que anteriormente tinha dado alguma proteção aos povos indígenas, foi retirado da zona. Uma invasão desta magnitude não ocorre há muitos anos e traz de volta memórias entre os anciãos indígenas do terrível período no final dos anos 80, quando cerca de 40.000 mineiros de ouro se mudaram para suas terras e cerca de um quinto da população indígena morreu em sete anos de violência, malária, desnutrição, envenenamento por mercúrio e outras causas (16). Também em julho, supõe-se que garimpeiros fortemente armados no norte do Brasil assassinaram o líder de uma comunidade indígena na comunidade de Wajãpi em uma reserva (13). Sendo esta a primeira invasão de uma reserva indígena na região do Amapá em 30 anos. Muitos vêem este assassinato e outros ataques nos últimos meses na retórica do presidente, que está incentivando a invasão das reservas.
Desde a posse do governo Bolsonaro em janeiro de 2019, dados nacionais do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) mostram uma continuação do aumento do desmatamento (88% a mais em junho de 2019 do que em junho de 2018). Essa tendência está levando o Brasil na direção oposta aos compromissos assumidos no Acordo de Paris, que incluem a meta de não desmatamento ilegal na região amazônica até 2030 (4). O governo do presidente Bolsonaro duvida da exatidão dos dados do INPE (link) e, como resultado, demitiu o chefe do instituto que havia defendido publicamente o trabalho do INPE contra o presidente (link) em julho, indicando um general como o novo chefe para rever a metodologia de coleta de dados. Da mesma forma, o chefe da FUNAI foi demitido em julho e substituído por um policial acusado de ter relações com o lobby agrícola, o que tem causado mais medo entre indígenas e ambientalistas à luz das intenções do presidente (14). Atualmente, cerca de três campos de futebol de floresta tropical são perdidos por minuto, principalmente através de projetos de infraestrutura, extração de madeira, mineração e agricultura – muitos dos quais não são permitidos por lei.
O governo Bolsonaro vê a crítica internacional à destruição da floresta amazônica brasileira como um ataque à soberania do país. Recentemente, ele disse que o Brasil não precisa do dinheiro de doadores internacionais como a Noruega e a Alemanha para o Fundo Amazônia, e que esses países deveriam proteger e reflorestar suas próprias florestas.
Conclusão:
Desde o fim da ditadura militar, o Brasil tem se comprometido cada vez mais com a proteção do meio ambiente e do clima e, às vezes, tem conseguido sucessos significativos no combate ao desmatamento ilegal da Floresta Amazônica, do Cerrado e da Mata Atlântica. Quando o governo Bolsonaro tomou posse no início deste ano, no entanto, a proteção ambiental e climática no Brasil sofreu um grave retrocesso, que os povos indígenas estão sentindo cada vez mais. O aumento do desmatamento, os ataques mais violentos aos povos indígenas, a invasão de reservas, a redução dos recursos financeiros para a proteção ambiental e para a FUNAI e os ataques verbais do presidente contra o trabalho do INPE têm caracterizado até agora a presidência de Bolsonaro.
A única notícia positiva desde que o novo governo tomou posse até agora parece ser que o presidente Bolsonaro não se retirou (ainda) do Tratado de Paris e que a proteção ambiental e climática será um aspecto central do acordo de livre comércio previsto entre o Mercosul (Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai e Venezuela atualmente suspensa) e a União Européia. O Acordo de Comércio Livre prevê a simplificação da exportação de produtos agrícolas brasileiros para a Europa, mas está sujeito a requisitos ambientais rigorosos e ao cumprimento do Acordo de Paris sobre o Clima. O ponto crucial: os parlamentos dos Estados-Membros da UE e o Parlamento Europeu devem ratificar o tratado. O presidente francês Macron já deixou claro (mas também por razões nacionais) que a França só aceitará um acordo de livre comércio se o Brasil acabar com o desmatamento ilegal na região amazônica e cumprir suas promessas do acordo climático de Paris (17). Recebeu apoio público do Comissário da UE responsável pelo Comércio.
Resta saber se a parte da sociedade civil brasileira comprometida com a proteção ambiental e climática e com a comunidade internacional conseguirá convencer o governo do presidente Bolsonaro a honrar seus compromissos no contexto do Acordo Climático de Paris para o restante de seu mandato, que só começou em janeiro. Tendo em vista a política atual, é de se esperar, infelizmente, que o Brasil dê mais um passo atrás na proteção ambiental e climática, superexplorando a natureza única brasileira sob a premissa de “desenvolvimento econômico do Brasil”. No entanto, o governo não parece significar “todos os brasileiros” sob “Brasil”, mas sobretudo a “indústria agrícola” e os “ruralistas” (grandes latifundiários). Os lucros desta política irão assim para os poucos brasileiros já ricos, enquanto a grande maioria da população irá embora de mãos vazias e o meio ambiente terá que arcar com os custos da destruição.
Referências (sites acedidos 18/08/2019):
(1) http://www.fundoamazonia.gov.br/pt/fundo-amazonia/
(2) https://foreignpolicy.com/2019/01/04/brazil-was-a-global-leader-on-climate-change-now-its-a-threat/
(3) https://www.voanews.com/americas/ap-explains-brazils-environmental-changes-under-bolsonaro
(4) https://climateactiontracker.org/countries/brazil/
(5) https://www.scidev.net/global/policy-brief/brazil-climate-change-a-country-profile.html
(7) http://oecdobserver.org/news/fullstory.php/aid/4286/In_deep:_Brazilian_oil.html
(8) https://blogs.worldbank.org/latinamerica/no-mystery-what-brazil-doing-address-climate-change
(9) https://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/14243.pdf
(10) http://www.qualidade.esalq.usp.br/fase2/iso14000.htm
(11) https://sustainabledevelopment.un.org/rio20.html
(13) https://www.bbc.com/news/world-latin-america-49144917
(14) https://www.theguardian.com/world/2019/jul/21/bolsonaro-funai-indigenous-agency-xavier-da-silva
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